“Após manifestação pacífica de professores, mascarados e policiais se enfrentaram no Centro nesta terça”. Essa foi uma das chamadas, encontradas no site Globo.com, para as notícias sobre a manifestação, que aconteceu no dia 15/10/13, no centro do Rio de Janeiro.
Sabemos que parece não ter nada a ver com a proposta do blog esse assunto, mas no final das contas tem tudo a ver! 190 pessoas foram detidas no final do protesto e pessoas foram conduzidas a delegacias e 43 foram autuados por crime de formação de quadrilha, a maioria sem provas sobre o envolvimento com grupos “vândalos”.
Ficam as dúvidas: O que é vandalismo? O que é manifestante? O que é protesto? O que é baderna? O que é repressão? O que é arbitrário?
Separamos três textos achados no perfil do facebook de Ciro Oiticica, estudante de jornalismo, que foi detido após o protesto do dia dos professores na Cinelândia.
O primeiro texto foi postado antes dessa manifestação, no dia 8 de outubro. Ele fala sobre a polêmica em torno do Black Bloc.
“Sobre a polêmica Black Bloc:A gente não pode restringir a discussão a uma polarização manifestante x vândalo, da mesma maneira que é contraproducente adotar uma postura de incondicional adesão ou repúdio. Seria reproduzir o discurso oligopolista midiático. Por isso mesmo, vale questionar a pertinência irrestrita da tática black bloc.Muitas vezes, foi necessária e ajudou o movimento: manteve os protestos vivos, visibilizou os movimentos sociais e escancarou a forma ditatorial de o Estado lidar com os cidadãos. Em outras, atrapalhou. Ontem, na minha limitada opinião, foi o caso.A polícia deixou que agíssemos sem qualquer intervenção. Era a oportunidade de mostrarmos que quando não tem polícia não tem confusão, que quem adota a tática é capaz também de fazer um protesto não-violento e de chamarmos a população em massa novamente pra rua. Mas mordemos a isca do Estado. E o BB fez o que condenamos nos políticos: se apropriou das capas e manchetes dos noticiários que deveriam destacar a passeata e as demandas dos educadores. Não podemos reduzir a questão política ao confronto com a polícia.Quem adota a tática tem que passar a pensar a organização dos atos e qualificá-los politicamente. Realizar encontros para debate, conscientização e reflexão, definir claramente a estratégia e desenvolver táticas diversificadas que se adequem às diferentes circunstâncias.Anarquismo é uma forma de organização que pressupõe liberdade E conscientização, responsabilidade. Não tenho visto esta segunda parte se desenvolver e corremos o risco de apenas justificar um comportamento inconsequente e individualista. Alguns dos praticantes da tática têm agido sem se preocupar com o efeito de suas ações para a mobilização e sem o consentimento dos que a integram. O coletivo precisa urgentemente ser levado em conta e pensado.Não existe tática sem estratégia.”
O segundo texto, é uma nota lançada pela ECO/UFRJ – Escola de Comunicação da UFRJ, onde Ciro estuda, após sua prisão.
“NOTA DE REPUDIO PELA PRISÃO DE ESTUDANTE DA ECO/UFRJA Escola de Comunicação da UFRJ repudia veementemente a atuação abusiva de policiais durante a manifestação desta terça-feira, 15 de outubro, no Rio de Janeiro, ao prenderem arbitrariamente um grupo de pessoas que estavam na área da ocupação na Cinelândia, entre as quais um estudante do Curso de Comunicação, Ciro Brito Oiticica, que cobria as cenas de conflito diante da Câmara Municipal.Segundo testemunhas, Ciro não participou de nenhuma ação direta contra a polícia, o patrimônio público ou privado, nem resistiu à prisão. Ele estava com a identificação de colaborador do coletivo de mídia independente Rio na Rua, grupo que tem feito coberturas jornalísticas e transmissões ao vivo das manifestações recentes na cidade do Rio de Janeiro. Sua atuação é motivo de orgulho para a nossa Escola pois, através de sua contribuição para uma maior diversidade de visões jornalísticas sobre o cenário político, Ciro está cumprindo não apenas com seu papel de jornalista em formação e midialivrista mas, sobretudo, como cidadão que luta pela construção de um país democrático.É condição elementar da democracia o respeito à liberdade de expressão e de imprensa. É fundamental entender que a atividade da imprensa não se restringe às empresas estabelecidas como tais, pois o exercício do jornalismo tem uma função social que ultrapassa de longe os limites impostos pelo mercado. Mas, sobretudo, é imprescindível exigir o respeito a todo cidadão que ouse exercer, nas ruas, seu direito de manifestação.Rio de Janeiro, 16 de Otubro de 2013Ivana BentesDireção da ECO/UFRJ"O conteúdo das informações divulgadas no ECOpress é de responsabilidade do solicitante””
O terceiro e último texto foi escrito por Ciro e postado hoje, dia 18/10.
“61 inocentes seguem presos.Não falarei da injustiça de ter sido detido sem justificativa ou provas.Não falarei da arbitrariedade da prisão.Não falarei do desespero das mães, que enfrentaram as dificuldades pessoais e a distância para verem seus filhos serem presos por lutarem pelo que acreditam.Não falarei de seu choro de perplexidade, sem saberem se o que sentiam era indignação por seus filhos serem tratados como bandidos ou orgulho por agirem como devem.Não falarei da privação de liberdade, nem dos constrangimentos degradantes do sistema carcerárioNão falarei porque 61 inocentes seguem nessas condições. Os mesmos que dividiram comigo os recentes momentos de angústia e alegria ainda se vêem submetidos a abusos intoleráveis contra sua dignidade.Ainda não há liberdade.Como disse Renato, a parte mais essencial de nós ficou naquelas celas. Essa parte ainda molha os pés no chão inundado pelas infiltrações, espanta inutilmente os mosquitos que impedem o sono e sonha com uma sociedade de fato. Essa parte ainda amarga a estranha sensação de ter sido presa por lutar pelo que acredita e a angústia de se culpar pelo choro de mães e pais e a preocupação dos amigos e familiares. E essa parte essencial só estará livre quando todos os que sofreram a mesma injustiça o estiverem.Mas há liberdade.Não nos podem tirar o que não se pode dar. E todos aqueles injustamente confinados em alguma cela sentem a inexplicável plenitude de seguir aquilo em que acreditam. Por isso mesmo, não tremem. Mantém-se íntegra a parte essencial dividida por todos nós e que se materializa em nossos ideais. Que importa o corpo, "habemus anima".Por isso mesmo, foi vital o profundo carinho demonstrado por amigos, familiares, militantes, advogados, escolas e faculdades. Mais vital até que seu efeito – a soltura. Embora tenha sido muito difícil sair sem os demais, por crer que aqueles que sofreram a injustiça do Estado também deveriam ser soltos no mesmo momento, alegrei-me imensamente com a mobilização de todos. Sentirei a mesma integridade ao seu lado, lutando pela libertação de meus companheiros, que sentiria se ainda estivesse com eles. Por isso é minha e nossa, acredito, a busca desses trabalhadores, moradores de rua, ambulantes e estudantes por justiça.Que essa corrente de afeto e esperança se estenda a todos e permita sua volta às ruas, para protestarem e alegrarem seus entes queridos!Cabral e Paes, através dos policiais, buscam expressar desesperadamente uma demonstração de força perante a sociedade. Mas só reafirmam sua fraqueza. Aplicar a violência arbitrária do Estado em corpos detidos de manifestantes apenas ascendeu a indignação na alma de muitos mais. O autoritarismo se escancara à medida que a sociedade desperta para a gravidade das violações à democracia que vêm sendo praticadas. A tal ponto que o medo, fomentado pelo Estado para justificar tais violações, é superado em nome da dignidade.Obrigado e parabéns a todos os entes queridos: amigos, familiares, Ocupa Câmara Rio, Rio na Rua, CEAT, IDDH, OAB, ECO/UFRJ, CARI, IRI/PUC!Manifestações surtem efeitos, desde que acreditemos juntos e participemos.Por fim, as famílias e amigos dos que seguem presos devem se manter tranquilos. Fomos bem tratados pelos funcionários enquanto estivemos presos e é mera questão de tempo que todos sejam soltos por inexistência de provas. Torço para que seja o mais rápido possível! Todos dividimo o sentimento de fraternidade que nos une em torno da certeza de se lutar pelo que é justo.Bruno, mais um que segue preso, deu o recado:“Oh mãe, não chore não/breve, breve to de volta para a manifestação“!”
Bom, a ideia desse post foi fazer uma relação entre essa época, tão conturbada e absurda, que nosso país começou a viver há 49 anos atrás, e achávamos que tinha sido superada, com a conjuntura atual da nossa política. Será que a ditadura acabou mesmo?
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